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Tupinambicas das Linhas não era uma cidade agradável. Essa conclusão antiga baseava-se no fato de que a maioria das edificações civis foi construída sobre pântanos.
As emanações gasosas pútridas foram observadas pelos primeiros colonizadores, mas insuficientemente desagradáveis para os convencerem de que o lado do rio, onde ergueram as primeiras construções, não era o mais saudável.
Os gases fétidos, resultados da podridão fermentada no subsolo, emergiam a todo o momento, tornando insalubres alguns locais específicos da urbe. Esse desconforto era intensificado quando não havia ventos e o calor tornava-se desprazível.
Jarbas o prefeito caquético e testudo, fora comunicado, há muito, sobre a existência dessa malignidade, entretanto ele afirmava que não podia fazer praticamente nada a não ser instalar dutos que facilitassem a vazão das exalações. O assunto ocupava boa parte dos espaços na mídia e das conversas dos moradores dos locais mais prejudicados.
Foi nesse clima que, naquela manhã de quarta-feira, Van de Oliveira Grogue adentrou o bar do Maçarico cantarolando:
- Litrão ê, ô... Litrão ê, ô...
Maçarico lia o Diário de Tupinambicas, que aberto sobre o balcão, noticiava uma blitz dos agentes da polícia, na prefeitura.
- Minha pinga! – exclamou Van de Oliveira notando o desprazer que provocava no Maçarico ao interromper sua leitura.
- Você viu o que descobriram na prefeitura? – perguntou o dono do boteco, enquanto enchia rapidamente o copo do cliente.
- Sempre tem maracutaia nova. Qual foi dessa vez? - questionou Van, depois de emborcar a “branquinha”.
- Prenderam um grupo de funcionários que simplesmente apagava dos computadores da Dívida Ativa, os débitos dos devedores de impostos que se propusessem a pagar 30% dos valores. E parece que o Jarbas sabia de tudo. Diziam que ele recebia alguma comissão.
- Eu ouvi essa notícia pelo rádio, no começo da madrugada. Levaram os computadores, e cinco suspeitos. – confirmou Van de Oliveira.
- Descobriram que o esquema de sumiço dos dados era feito há muito tempo. Desviaram milhões e milhões de reais da prefeitura. O prejuízo é bem grande. – completou Maçarico.
- Isso explica o carro novo que o Mariel Pentelini Demorais comprou de uma hora pra outra. – concluiu Van de Oliveira.
Atendendo a um gesto do bebedor, Maçarico abriu uma cerveja postando-a sobre o balcão.
– O cara não tinha nada, mas depois que passou a trabalhar na prefeitura, deixou o bigode crescer e comprou até apartamento no centro da cidade. – continuou Grogue.
- O Mariel Pentelini não é aquele mocorongo entrevado que tinha uma serralheria, falida logo depois da morte do pai dele? – quis saber o Maçarico.
- É esse mesmo. Eu o conheço desde criança. Na casa em que os pais dele moravam havia um limoeiro, uma pitangueira, um orquidário feito com bambus e, bem defronte a porta da cozinha, um gramado pequeno. Naquela casa, antes dos pais do Mariel mudarem pra lá, funcionou uma lavanderia. Isso explicava a existência de quatro tanques enormes num dos lados da morada. Perto dos tanques tinha um aposento com uma janela pequena e a porta bem rústica. Ali o pai do Mariel depositava pneus usados e até material de campanha política.
- Não era naquela casa que funcionou um asilo de insensatos? – indagou o dono do boteco.
- Isso eu não sei. Mas naquele tempo na sala havia cristaleira, mesa e cadeiras no estilo colonial, quadros nas paredes e o ambiente todo era bem agradável.
- Que eu saiba esse Mariel Pentelini vive de bar em bar curtindo as “canas” que entorna e cofiando o bigode branco. Ele não estava aposentado? – inquiriu Maçarico.
- Nada. Juntou-se com a “virgem dos lábios de mel” da Vila Dependência e toca o trole até hoje. – garantiu Van de Oliveira.
- Fazer o que, não é? Temos de ter paciência, muita paciência. – garantiu Maçarico.
Dando-se por satisfeito e finalizando o encontro, Van de Oliveira perorou:
- Por falar nisso, Maça, anota pra mim essa continha, que logo no fim do mês eu passo pra acertar. Tudo bem?
06/10/2011
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