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O Último a Sair

por Fernando Zocca, em 01.10.15

 

Alguém duvida que a causa principal da guerra na Síria (que já dura quatro anos) seja o enraizamento da família de Bachar al-Assad no poder?
O pai do atual ditador governou o pais por mais de 40 anos. Imagine o emaranhado das injustiças e dos privilégios formados com a manutenção do monopólio da autoridade, do açambarcamento do mando, durante tanto tempo.
A longevidade desse porte, em cargos públicos, a gente já viu nas monarquias. Mas em estados democráticos legítimos não.
Pense nos desequilíbrios sociais, econômicos, politicos, na corrupção e imoralidade que a estagnação da rotatividade no comando provoca num Estado e você terá, como resultado, essa guerra que matou milhares de pessoas, originou o êxodo de outros milhares, bem como a destruição de cidades inteiras.
Assad tem o apoio da Russia governada por Wladimir Putin. Esse suporte é dado com a venda de equipamento militar, assistência técnica e participação de tropas.
O ditador Sírio, e seus aliados russos, objetivando a eternização no governo, bem como os privilégios de tantos e tantos anos de mamata, garantidores das fortunas ganhas também com o comércio de armas, combatem os terroristas do estado islâmico que nada mais buscam do que a troca do governante com o uso da força.
As crueldades cometidas tanto pelos defensores de Assad quanto pelos terroristas do estado islâmico, publicadas nas redes sociais, chamaram a atenção do mundo.
Os norte-americanos, solicitados a intervir no conflito, consideram ser necessário, para derrotar o terrorismo, conhecido pela maldade extrema com que trata seus prisioneiros, destituir Assad do poder.
Já os Russos acham que não. Que mantendo o ditador será mais fácil a derrota do terrorismo.
Enquanto isso o mundo se prepara para receber os milhares de refugiados que, deixando para trás suas casas, suas coisas, suas cidades, buscando abrigo na França, Alemanha, Itália e até aqui no Brasil, carecem do auxílio humanitário.
Na verdade tanto o estado islâmico quanto o atual governo Sírio pouco se importam com a população, com as necessidades do povo.
O que lhes interessa são as mordomias relacionadas ao poder. É o desequilíbrio na relação entre os detentores da força e os mais fracos que, por indisporem dos meios de defesa, precisam fugir das vicissitudes por mar e terra.
Mas afinal, o que governarão os litigantes depois de tantos mortos, feridos e destruição?
Se a atual situação de desespero continuar na Síria, a frase "o último que sair apague a luz", não terá muito sentido.

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publicado às 15:44

Caravelas

por Fernando Zocca, em 03.01.15

 

 

 

 

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- Van, meu lindinho, cabecinha chata, embarangado, pelancoso e arruinado bêbado, diga-me, aqui e agora, nesta mesa do bar do Bafão: é verdade que você tinha um gatinho que se chamava Noé? - perguntou Luísa Fernanda.

- Sim. É verdade. Noé não me dava sossego. Era sempre assim: Noé mia de manhã, Noé mia de tarde, Noé Mia à noite. Noé mia no quarto, Noé mia na cozinha, Noé mia no banheiro, Noé mia no quintal. Era uma chateação danada - respondeu o ébrio com voz anasalada.

- Por que, meu amado mestre etílico, você deu ao seu gato esse nome: Noé? - quis saber a companheira.

- Ora porque... Noé tinha um barco que se chamava arca, arco... Sei lá... Dentro dele - do barco - Noé fez entrar uma porção de bichos. Tinha mais animal dentro do navio do que fora dele.

- Mas de que jeito era esse barco? Parecia caravela? Sabe aqueles navios grandes do tipo da Santa Maria, Pinta e Nina usados pelo Cris?

- Que mané Cris? 

- O Cristóvão Colombo, ora bolas - concluiu Luisa Fernanda.

- Ah, não sei. Só sei que tinha mais bicho do que gente lá dentro, inclusive gatos - afirmou Van Grogue.

- Mas na arca do Noé tinha velas? - quis saber Luisa.

- Acho que não. 

- Nas caravelas tinha um monte de velas. E pra segurar aquelas armações todas, veja só que trabalho, tinha muitas cordas, fios e cabos. Você manja de cabos? - explicou Luisa. 

- Olha, Luisa, cabo bom pra mim é cabo de caneca de chope. No mais não sei do que se trata - respondeu Van.

- Tanto a tal de arca, quanto as caravelas eram feitas com madeira, paus, tábuas - ensinou Luísa.

- Sim, mas e eu com isso? - Van queria um sentido para aquilo tudo. 

- Ora, nas cordas, nos fios das velas, pousavam pássaros, passarinhos. E veja só que perigo: se naqueles mastros enormes pousassem pica-paus e começassem a bicá-los, logo não haveria mais barco nenhum. Morou? - Luisa explicava bem as charadas. Era preciso espantar ou prender os passarinhos.

- Ah, sei... - murmurou o desanimado Grogue.

- E tem mais, viu? Naquelas embarcações havia lugar até para alguns artistas que pintavam telas lindas, memoráveis, eternas. 

- Sério? - Van estava curioso.

- É claro, meu burocrático lindinho. Então você não sabia que em determinados navios havia algumas pequenas hortas cuidadas por especialistas agronômicos?

- Sabia disso, não. Pra mim é novidade - duvidou Van.

- É meu amigo. O bagulho era complicado. Tinha até briga em que se disputava o comando da embarcação. Quando mais cruel fosse o capitão, melhor seria.

Van bebeu um gole de cerveja e perguntou:

- É verdade que eles levavam os barcos nos trens?

- Ah, sim. As parcerias eram comuns. Os barquinhos iam e vinham nas carrocerias dos caminhões. 

- Me disseram que nas cavernas das embarcações, às vezes, haviam morcegos. Será verdade? - quis saber o curioso Grogue.

- Não dá pra duvidar. Dizem que O Cavaleiro das Trevas... Conhece? Era um morcegão invocado que vivia com a vara na mão passeando de bote, prá lá e prá cá.  Ele cavocava o chão com uma enxada buscando minhocas. Ele queria pescar lambaris, cascudos, mandis e outros peixes. Mas quando pegava uma piranha ele ficava temeroso. Ele achava que piranha boa era piranha frita. Para a manutenção e fabricação dos botes, os fabricantes recorriam aos marceneiros que trabalhavam, inclusive, nas fábricas de urnas. Manja urna mortuária?

- Sem chance de prosseguir com essa conversa, minha nobre e querida Luisa Fernanda. Paro por aqui - disse Grogue com firmeza colocando o copo na mesa. 

- Ah, mas eu não te contei e, é claro que você não sabe, - continuou Luísa - que na fabricação das caravelas tinha até pedreiro que dava uma força, de vez em quando, pros caras? 

- Bafão, manda a conta - finalizou Van Grogue levantando-se e sacando a carteira, recheada com notas graúdas, do bolso traseiro. 

 

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publicado às 16:42

Subtração desnecessária

por Fernando Zocca, em 26.11.14

 

 

 

Quem já foi adolescente sabe que a fome, durante este período da vida, especialmente no denominado estirão, é inclemente. 

As pessoas, nesta fase, comem muito e por isso não é raro ouvirem copiosas críticas e condenações.

O comportamento repressivo dos pais, certamente, não inibirá a fome no ser que se desenvolve rapidamente.  Entretanto pode incentivar a criação de mecanismos que driblem os momentos de reprovação, permitindo que o jovem satisfaça-se. 

Então, é bem comum perceber que o garoto, ou a garota, procura comer às escondidas, a sós, geralmente na calada da noite. 

Essa atitude embasa-se tanto na busca da saciedade quanto na autoafirmação, no ato de rebeldia, quando viola as determinações superiores.  

A afirmação desse hábito pode inspirar comportamentos semelhantes, condenáveis. 

Sem dúvida que, desta forma, o ter consigo algo confortante, às escondidas, contribui para a formação da cleptomania.

A moça que não consegue emagrecer, cujos pais são alertados por parentes, amigos, vizinhos ou conhecidos de que a filha subtrai objetos, dos quais não necessita, ou que tem dinheiro para pagá-los, são os elementos comuns componentes de muitos dramas familiares.  

A conduta legal da vítima, como a de registrar queixa na delegacia de polícia, pode agravar a situação psicológica do rebelde.  É claro que o aconselhamento psicológico ou até mesmo o acompanhamento psiquiátrico, além das determinações da lei, serão fundamentais para a adequação do comportamento.

Nas culturas onde a educação seria mais liberal as consequencias da violação das normas não deixariam de ser punitivas, com ritos, porém, diversos dos usados no Brasil.

A função correcional das penas aplicadas pelo judiciário é fundamental para a manutenção da ordem, do progresso e, inclusive até, da coesão social. 

Quem não se lembra das verdades anunciadas nos versos "Perdoar é para Deus. A gente só se arrepende depois que faz"?

 

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publicado às 11:57

O jogador de baralho e a professora

por Fernando Zocca, em 06.05.14

 

 

Você já pôde notar a existência daquele tipo de personalidade que se faz de vítima. 

É um jeito de ser que atribui a alguém, ou a situações especiais, os seus sofrimentos intermináveis.

Entretanto não deixa de ter certa razão o adulto que passou a infância "triturado" pelo ressentimento dos tios e primos mais velhos. 

Ponha-se na situação de quem precisava muito do dinheiro para custear estudos em outras cidades, fazer frente às despesas comuns do dia-a-dia ou pagar dívidas de jogo, e não podia recebê-lo em decorrência de estar ele na posse de um...digamos usurpador.

Você já percebeu que todos os males do mundo teriam como fonte única o safadista desjuramentado que, com a mulher e um filho imberbe, se acomodaram na casa que deveria ser dividida entre todos os herdeiros do vovozinho falecido.

Agora, meu querido e paciente leitor, some às agruras dos frustrados o fato de não poderem ter eles mesmos um filho. Não por haver qualquer tipo de impotência sexual do varão, causada pelo tabagismo, alcoolismo e noitadas inteiras na gandaia, na jogatina de baralho, Não. Longe disso. 

Talvez por incompatibilidade sanguínea quis o destino que o casal, formado pelo exímio jogador de cartas e a professora promissora, não pudessem dar ao mundo um descendente legítimo. 

E então? Como fazem os casais que vivem tal vicissitude? 

É comum à essas pessoas, que passam por esse tipo de problema, resolverem-no adotando uma criança.  

Perceba que a frustração causada pela impossibilidade de ter um descendente foi suprida pela adoção, mas a de estar na posse do bem imóvel ficou latente, pulsante, teoricamente embasando, inclusive, as histórias de ninar do infante recém-chegado. 

Como sagaz que é o meu nobilíssimo leitor já pôde vislumbrar a existência dos parentes ascendentes do neném adotado. 

E haveria prazer mais satisfatório do que aquele em que se enreda, calunia e difama (aos familiares-ascendentes do guri)  o tal devedor que não desocupa o bem do espólio?

Não, meu caro, não haveria mesmo. 

E tome lero-lero: "deficientes mentais", "doentes do baço", "racistas", "nazistas" e "encrenqueiros", seriam os adjetivos mais leves dentre todos os impingidos àquela família, espécie de judeus usurpadores dos territórios palestinos do sertão paulista. 

Se a maledicência fosse face a face, até que não causaria tantos males. Mas calúnia à socapa é muito mais eficiente, destrutiva, mortal, tucana e infame.

Essa, meu amigo, leva a morte à cabeceira do leito. 

Deus me livre.  

 

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publicado às 11:40

Paixões a Arder

por Fernando Zocca, em 17.11.12

 

 

É inegável que a violência grassa nas grandes concentrações humanas. Não são incomuns as reuniões de pessoas que passam horas a bebericar, para depois, por um me da cá aquela palha, agredirem aos próximos com chutes no peito ou garrafadas nos costados.

De quem seria a culpa de tanta selvageria, de tanta falta de educação? Como você pode dizer ao pai de um moço amancebado, viciado em drogas, que seu filho agride pessoas com palavras, fisicamente com pontapés e garrafadas, se o próprio pai do meliante também passou por condenação penal e não está nem aí com o problema?

Como pode o cidadão comum dirigir-se à gordurosa mãe do proxeneta a fim de lhe pedir a frenação da loucura daquele produto podre do seu ventre? Ô carniça!
Que tipo de conversa teria você, meu amigo leitor, com um assassino em potencial, que faz do ócio dos seus dias inúteis, momentos de perturbação do sossego alheio?

Que diria você, minha amiga leitora, para uma pessoa sustentada com o dinheiro que recebe a concubina, em decorrência de uma ação de alimentos proposta contra um pobre infeliz ingênuo, apanhado na armadilha da barriga de aluguel?

O que diria o senhor delegado de polícia, a senhora assistente social da prefeitura, para as pessoas amontoadas em cortiços de onde não se vê sair nada de bom que não seja drogas ilícitas?

Observa-se, em alguns trechos, da abandonada Vila Independência muitos cistos, cabeças-de-porco, verdadeiros chiqueiros formados por amontoados de pessoas vindas de famílias desfeitas, totalmente privadas de boas maneiras e civilidade.

Onde estão os pais responsáveis por esses selvagens? Onde está a autoridade policial a quem incumbe a repressão ao tráfico de drogas ilícitas?

Onde estão as autoridades legislativas e do executivo dessa cidade? Estariam por certo em lugares diversos dos demais trechos em que permanecem imobilizadas nas perenes poses para as fotos com as quais se exibem ao púbico?

Cadê a educação das jovens adolescentes abandonadas pelo pai irresponsável, quiçá agalhado pela mulher leviana? Onde está a responsabilidade do avô libertino, que nada faz pela educação das aprendizes de meretriz, a não ser esperar com avidez o pagamento efetivado constantemente pelo poder público?

Onde está a sensatez da velhota ocupante do lugar da avó morta em circunstâncias ocultas?

Onde estão os pais da moça que vive no bem-bom usufruindo as pensões alimentícias, pagas por homens diversos, genitores dos filhos adulterino e natural?

Que segurança se pode ter nestes bairros distantes onde no mínimo você pode levar um pontapé no peito ou uma garrafada nas costas?

Piracicaba é maior do que esse lixo hospitalar, lixo de cadeia, lixo de prostíbulo, e lixo de botequim que se acumula nos cortiços obscuros e tenebrosos da cidade, justamente neste começo do fim do mundo.

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publicado às 13:40