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Quem crê em astrologia pode crer também naquela espécie de vaticínio existente, em forma de notícias, nas capas dos grandes jornais.
No meu caso, cidadão nascido no dia 1º de setembro de 1951, ano seguinte ao fracasso da seleção brasileira - atribuído ao goleiro Barbosa, jogador do Botafogo do Rio de Janeiro - no Maracanã, as matérias de capa de O Globo, traziam algumas notícias relevantes para mim.
Uma delas nos dá conta de que uma criança de colo, na Califórnia, Estados Unidos, diante da negativa da sua mãe em dar-lhe bombons, bateu com a cabeça no chão, matando-se.
A segunda matéria nos informa que um jardineiro negro, e sua família, deixariam a cidade de Campinas SP, para residirem numa favela do Rio de Janeiro.
Na tarde do dia 7 de abril de 1952, minha mãe, comigo no colo, defronte ao portão do Grupo Escolar Barão do Rio Branco, dáva-me de mamar usando a mamadeira.
Quem conheceu a região central de Piracicaba da década de 1950, sabe que na esquina das Ruas Governador Pedro de Toledo com a Ipiranga havia, além do Grupo Escolar, o bar do Japonês conhecido por Sasse, e um armazém de secos e molhados do Mário Moral.
Um irmão do meu pai, tio Bruno (Brunico), formado em contabilidade no Zanin, era alcoólatra, e não saia do bar do Sasse.
Ele ia e vinha ao boteco várias vezes durante o dia. Vestindo um paletó surrado, sempre com um exemplar de jornal no bolso traseiro da calça, ele passava horas e horas seguidas sentado a uma daquelas mesas do botequim, diante de um copo de pinga e tagarelando muito.
Você sabe, meu amigo, que zum-zum de botequim pode ser contagiante.
Eu tinha sete meses de idade e, segundo a minha mãe (que Deus a tenha em bom lugar), a um movimento brusco meu desprendí-me dos seus braços caindo ao chão fraturando a clavícula.
Já contei essa passagem num dos milhares de textos meus publicados na Internet durante estes anos todos; fui atendido na Santa Casa de Misericórdia.
Durante os meses seguintes, com o tórax engessado, fui submetido a massagens periódicas por um massagista conhecido por Peixe.
Bom, depois disso tudo, recuperei-me, tendo uma infância e adolescência praticamente normais, a não ser por problemas surgidos após vários anos, quando precisei de atenção hospitalar.
No hospital ocupei, provisoriamente, durante algum tempo, uma vaga destinada aos pacientes cujos tratamentos eram financiados pela prefeitura.
Aí, meu astuto e inteligente leitor pode perguntar: mas o que tem a ver as notícias (a criança que bateu com a cabeça no chão e a família campineira que se mudaria para o Rio de Janeiro), publicadas em O Globo, no dia 1º de setembro de 1951, com a sua vida?
Eu diria que quando o ódio, o ressentimento, o rancor e a intolerância, suplantam os sentimentos de afeto, compaixão e solidariedade, todos os fatos relacionados com você podem ser usados de forma negativa, não para construir, mas para destruir.
Considero valorosas as almas que conseguem transmutar as situações adversas em bendições.
Dentre as provações da vida, cabem aquelas em que recebendo as asperezas hostis, os méritos estariam em transformá-las em carinho e afeto.
Mas isso não é muito fácil. Depende do tempo e da maturidade.
Criança mimada não deixa de ser um problema. Chega um momento da relação genitora filho, por exemplo, que diante do "emburramento" do guri, a mãe, às vezes, vê-se obrigada a prometer coisas ou a fazer concessões nem sempre legais.
Quando as vontades se opõem, e a fim de obter a anuência do infante, se a mamãe concordar com os desejos feridores dos direitos alheios, sinalizará uma certa fraqueza moral, servindo também de exemplo negativo para a criança que tenderá, no futuro, a repetir o comportamento.
Essas atitudes complacentes da mamãe contribuirão também para a má formação do seu descendente, se diante das situações conscientes de cleptomania, não corrige o filho, no momento exato do deslize.
O senso de justiça da progenitora responsável, certamente rejeitaria, por exemplo, que o filho, tomado pela paixão avassaladora, tentasse levar para casa um cachorro que lhe aparecesse pela frente, na rua, durante um passeio.
E não deixa de agravar a situação, a atitude materna que ao invés de reconhecer o erro, procura atribuí-lo a quem não tem nada a ver com o babado.
É claro que o quadro se complicaria ainda mais se o tal cachorro é mal tratado e ainda por cima abandonado na rua.
Seria muito mais fácil para a mamãe "bondosa" suportar as crises de teimosia do filhote mimado, do que aguentar depois, todas as consequências terríveis da sua benevolência.
Há quem ache que não pagar o café consumido num balcão seja semelhante a levar, “às ocultas”, no porta-malas do carro, o cachorrinho estimadíssimo por seu dono legítimo.
O reconhecimento do equívoco, tanto pela mamãe quanto pelo filhote, e o firme propósito de não cometê-lo novamente, contribuiriam para a vivência de momentos mais livres das influências negativas que certamente procurariam tirar proveito do caso.
Existem mulheres que, para vingar-se das surras dadas por maridos alcoólatras, enfeitam-lhes a testa com galhadas imensas.
Mas isso já é outra história e fica para uma nova oportunidade.
Durante a caminhada não é incomum suportarmos reveses desconcertantes. Mas ao invés de nos encharcamos com as lamentações murmurantes, o mais salutar é sair à luz, buscando melhores circunstâncias.
A procura por soluções denotaria o reconhecimento de que as nossas atitudes não são as mais corretas e que, portanto, precisamos mudar o modo de reagir aos problemas diários.
As transformações ocorrem com tamanha velocidade, nesse princípio de século 21, que urge revermos os velhos costumes atadores a situações estagnadas, improdutivas.
Quem falaria em Internet há alguns anos passados? Quem diria ser possível, às mulheres, concorrer nas eleições, para a presidência da República? Não chamariam “louco” o cara que ousasse dizer ser real a possibilidade de um negro tornar-se presidente dos Estados Unidos?
No entanto isso tudo está ocorrendo. Os hábitos antigos, costumes do século precedente, não teriam tanto peso na solução dos problemas atuais.
Então ao contrário de permanecermos imóveis, improdutivos, descontentes, irados e sem bom senso, seria benigno que nos dedicássemos a aprender a fazer algo útil aos nossos semelhantes mais próximos.
O nhenhenhém não dá camisa a ninguém. Só o gogó não resolve a problemática familiar angustiante. Carecemos de ações, de obras em prol do próximo.
É chegada a hora de arrumar um bom serviço e trabalhar. A criançada agradece.
Delsinho, o cabeleireiro piriguete, morava há muito tempo com a irmã mais velha. Apesar de dividirem o mesmo teto, eles quase não se viam. Não obstante a amizade que os unia, uma das manias do mocinho, de cabelos encaracolados, vexava a mana barriguda.
Delsinho, o lindinho, habituara-se a vestir as roupas da falecida mãe. Essa mania teve início logo depois do falecimento da boa velhinha. Diante do guarda-roupa da mamãe, ele teria empacado num acesso de dúvidas: doar ou não doar as vestimentas da finada?
O mocinho delicado trabalhara, quando muito jovem, na Companhia Tupinambiquence de Força e Luz. E fora lá naquele ambiente, rodeado por mesas, máquinas de escrever, calculadoras e papéis que o menino conheceu o Fofão.
Fofão trabalhava na oficina mecânica do Nero careca, onde lavava as peças com gasolina. Por ser aprendiz, do experiente mecânico Nero, começara no ofício bem de baixo: lavando as peças dos motores desmontados.
No afã de telefonar para a oficina do Nero, buscando saber se esse ou aquele veículo, da Companhia Tupinambiquence, estava pronto ou não, foi que as almas de Fofão e Delsinho se encontraram.
Numa tarde, depois de ouvir duzentas vezes, do seu chefe as ordens para que telefonasse à oficina, a fim de saber se uma caminhonete ficara pronta, Delsinho atendido por Fofão, sentiu-se enamorado pela voz que ouvia ao telefone.
Então tomado por um enlevo assaz arrebatador, Delsinho resolveu ir pessoalmente à oficina do Nero, onde estava o dono da mais bela voz, que jamais ouvira em toda a sua vida.
E foi assim que aquele caso entre Delsinho e Fofão teve início. Durante os primeiros meses do relacionamento algumas atitudes, a fim de harmonizar as preferências, eram cobradas por ambos.
Fofão mantinha um bigode fino margeando o lábio superior. Mesmo com as reclamações do companheiro, durante os passeios de carro, nas tardes de domingo, o dono do bigode recusava-se a raspá-lo.
- Esse bigodinho ridículo me faz lembrar o diretor do Parque Infantil, lá na Rua Botadentes, onde minha tia me levava pra brincar com os moleques – dizia Delsinho acomodado no banco do carona, daquele Simca Chambord amarelo e branco, legítima propriedade do Fofão, numa tarde de domingo do outono de 1962.
- Ah, não esquenta Delsinho. Já não chega essa mania de andar pra cima e prá baixo com esse roupão branco ridículo? – respondia Fofão em defesa dos seus pêlos supralabiais.
- Olha, mas aquele homem era mesmo muito chato. Ele vinha logo com uma prancheta na mão esquerda, uma caneta furreca na direita e um apito pendurado no pescoço. Quando chegava no meio da molecada gritava com todo mundo dividindo o bolo de gente em duas turmas. Uma leva ia pra um lado do campo e a outra pr´outro. E sabe o que ele fazia? Ele ficava no meio, entre os dois bandos segurando uma bola de capotão acima da cabeça das hordas. E quando ele soltava aquela bola, meu amigo, não adiantava assoprar o apito. Que saísse da frente que era chute pra todo lado.
- Você exagera, ô Delsinho. Para com isso. – reclamava Fofão, engatando uma terceira marcha.
- Nada! O tal saia pulando feito uma gazela e subia nos primeiros degraus da arquibancada que circundava o campo. Lá de cima, a salvo, ele apitava e apitava aquela coisa horrorosa. Teve uma hora que eu não agüentei. Pedi pra sair. Eu não sabia qual era o meu time. Era tudo misturado. Não tinha uniforme. Quando eu pegava a bola, alguém pedia pra eu passar. Eu passava e o cara era do time contrário. Puta reclamação! Eu não suportei e pedi pra sair. Fiquei sentado vendo a zoação. Deus me livre!
- Ah, para Delsinho! – Olha estamos passando em frente ao prédio da prefeitura.
- E depois que tava todo mundo suado, cansado, com o corpo cheio de terra o cara mandava todos ficarem numa fila enorme. Eles davam ou pão com banana ou pão com leite moça. Mas não era genial?
- Que vida hein Delsinho?
- Ah, olha, nem sei. Um dia até pensei em morar na Holanda. Lá tem tamancos, diques e pintores famosos.
Não aguento mais esperar por alguém...
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